Lados opostos

Ela queria ir para a esquerda. Ele, para a direita.


Discutiam, ficavam em silêncio, balbuciavam, e voltavam a brigar. Na visão dele, o direito era melhor, ficava mais fácil ir pelo caminho reto, “o traçado mais perto entre dois pontos”, por quê ir pela esquerda? Aquele caminho sinuoso? Da esquerda só se esperava o caos e a bagunça, a esquerda podia ser maior, mas não tinha a organização do caminho da direita: sempre havia gente demais, barulho demais, reclamação, e turbas.

Ele, para ela, andava em círculos. A direita era chata e previsível, reta, sem prazeres curvilíneos, sem surpresa. Na direita, o oráculo sempre sabia o próximo passo. Talvez ele fosse o oráculo, talvez não, era isso que lhe dava curiosidade de saber quem era ele realmente. Ela até que gostava do jeito politicamente correto dele, mas o mistério... ah o mistério... era o que realmente a atraía.

No fim das contas, os caminhos levavam ao mesmo objetivo, mesmo que sinuosos ou retos, terminavam na mesma floresta.

Mas que caminho seguir? Já que nenhum dos dois estava errado, eram amantes, sim,mas eram suspeitáveis. Mesmo que ela fosse para a direita, e ele, para a esquerda, nunca seriam os lados certos. Cada um foi para seu lado, sem nem mesmo olhar apara trás.

Talvez, por isso, não chegassem a lugar nenhum...

Paralelos

Um dia comum sempre tem início no acordar, café da manhã, banho, despedida. Sim, todas as pessoas comuns fazem isso, exceto R. Ele não é um homem excêntrico, mas calcula possibilidades infinitas dentro de situações corriqueiras. Geralmente, olha para o chinelo em frente à cama e põe-se a pensar “Puxa, o que aconteceria se eu não colocasse o chinelo hoje?”, ou, “E se eu não tivesse chinelo?” Muitas vezes, R se pegava devaneando sobre isso, e acabava por mistificar pequenos assuntos.


Nesse dia em especial, o sábado, R levantou e colocou os sapato, pensou no que aconteceria se não o fizesse, e teve medo dos resfriados e outras doenças rastejantes. R abriu a janela e olhou para o horizonte, imaginando como seria voar. “Os pássaros têm sorte.”

Todo o dia comum de R foi marcado por essas excursões as realidades alternativas, lugares onde ele tinha descido o prédio pelas escadas, ao invés de usar o elevador. Viu quando um carro passou pelo sinal vermelho, e ficou imaginando o que aconteceria se o carro batesse, ou se um guarda estivesse no cruzamento.

Teve até a vez em que encontrou, por acidente, sua ex namorada, Márcia. Pensou nela como uma possibilidade, viu um casamento que não aconteceu, filhos que não existiram, sogra, churrascada, barriga de cerveja, aposentadoria, INSS. Ela já tinha virado a esquina, com um seco “tchau” ,e ele com um “té mais”, quando ele pensou no que teria acontecido se eles não tivessem namorado. Não existiram possibilidades que ele acabara de inventar.

O tempo, devorador, corrupto, irrefreável, sincrônico. Chegou ao meio dia. R tinha atravessado a rua para comprar jornal, viu que o garoto da banca não devia ter mais que dezessete anos, pensou no que ele se tornaria daqui a algum tempo, fez uma linha temporal de sua juventude com amigos, sem amigos, e depois criou uma chance do garoto se tornar inteligente, quando mostrou a ele o livro que carregava.

R deixou a imaginação de lado, quando começou a chuva. Mas, concentrou-se muito para não pensar no que aconteceria se um raio o atingisse: os poucos amigos visitando-o no hospital, a namorada-inexistente enviando flores, o sobrinho gordinho e mirrento roubando seus presentes. Até pensou no caso que poderia ter com a enfermeira, se ela fosse bonita.

Tudo em sua vida não passava de “se”, e não era muito o que realmente “era”.

R voltou para casa após sua corrida matinal, fazia isso durante o fim da tarde, não gostava da manhã, onde nada tinha acontecido, nem tinha a chance de ter acontecido. Só quando ligou o chuveiro é que percebeu seu erro: não comprara pão.

Mas, o que aconteceria se tivesse comprado?

Esperança

Vou esperando o mundo melhorar.


Vou esperando as coisas acontecerem, ao lado dos desajustados do mundo, tentando ajustá-los fundamentalmente numa ideia vaga. Em ascensão mergulham sentimentos profundos que se revezam entre gritos e berros torturantes.

É só um texto…

A droga é só minha. Não divido meus vícios com ninguém. Espero. Espero. Esse é meu vício. Poso parar quando quiser. Posso deixar de lado esse monte de coisa profana que mergulha minha alma cada vez na ascensão inversa de pavores e angústias. Oh angústia, desata-me o nó da garganta.

Olho no celular do destino, cuja agenda não passa de um cronômetro libertador. Ele é o princípio sem ômega. O versículo principal de um sacro livro de páginas marcadas, viradas, rabiscada, esquecidas.

Qual era mesmo a página? Não a marco para não lê-la de novo. Mas meus dedos percorrem avidamente as folhas amareladas de uma tora velha e rejeitada.

Prometo ser o messias.

Prometo.

Espero.

Tinh um menino...

Tinha um menino na minha rua que não podia dormir


Ele não pescava. Então ele era urso.

Todavia de urso ele não tinha nada. Nem garra.

Ele não roncava. Então ele era gato.

Entretanto, de gato ele não tinha nada. Nem bigode.

Ele não sonhava. Então era um lagarto.

Só que de lagarto ele não tinha nada. Nem escamas.

Ele não bocejava. Então era um homem.

Só que de homem ele não tinha nada. Nem alma.

Vergonha

Eu nasci sem vergonha.


Aí me cobriram. Aí me deram nome. Aí me bateram, pra eu chorar. Aqui me enganei, porque me bateram, depois me deram um nome.

Aí me deram pra minha mãe, pro meu pai, pra minha família. Eu tinha nascido sem vergonha, mas estava coberto, mas estava nomeado, mas estava batido, mas estava enganado, mas estava com minha mãe, mas estava com meu pai.

Meu pai que não está mais aqui. Meu paizinho que me carregou. Meu pai que não deixou me baterem de novo.

Mas eu estava com ele.

I ENCONTRO EXTENSÃO PARA O FUTURO.

A Pró-reitoria de Extensão da Universidade Cruzeiro do Sul, Devir Livraria e Terracota Editora propõe o I ENCONTRO EXTENSÃO PARA O FUTURO.


O evento faz parte do Programa de Extensão Prática de Escrita e outras Linguagens. Neste ano, o convidado é Bruce Sterling, escritor, jornalista, designer e crítico.

Bruce foi locomotiva intelectual do Movimento Cyberpunk e “Visionário Residente” junto ao Art Center College of Design em Pasadena, Califórnia, durante o ano de 2005. Em 1998, Sterling criou o Movimento do Design Viridiano (http://www.viridiandesign.org/), para transportar atitudes “verdes” ao campo do design. Reforçando sua preocupação com o meio ambiente, no romance Tempo Fechado Sterling também prova que a atitude cyberpunk não está restrita aos grandes aglomerados urbanos.

No programa há três encontros: uma conferência, um workshop e um simpósio.

É intenção de Sterling, conhecer portfólios de estudantes de designer e arquitetura, além de realizar um bate papo com escritores sobre ficção cientifica.

O local do evento é o anfiteratro do campus Liberdade da Universidade Cruzeiro do Sul.
O evento acontece em dois dias, veja a programação:

03/12 – 19h30 às 22h30

Mesa de Abertura:
Profa. Dra. Sueli Cristina Marquesi – Reitora da Universidade Cruzeiro do Sul
Prof. Dr. Renato Padovese – Pró-reitor de Extensão da Universidade Cruzeiro do Sul
Prof. Douglas Quinta Reis – Diretor Editorial da Devir Livraria
Prof. Claudio Brites – Diretor Editorial da Terracota Editora

Workshop: “Ficção Científica para o Século 21″
Convidado: Bruce Sterling
Mediação: Roberto de Souza Causo – Especialista em Ficção Científica e Escritor
04/12 – das 10h às 12h

Painel: “Design e Desafios do Século 21″
Convidado: Bruce Sterling
Mediação: Priscila Henning (História da Arte, Arquitetura e Restauro)
Elisabete Barbosa Castanheira (Desenho, Criatividade, Programação Visual)

04/12 – das 13h30 às 15h30
Workshop “Design e Futurismo
Convidado: Bruce Sterling
Mediação: Priscila Henning (História da Arte, Arquitetura e Restauro)
Claudia Trevisan Fraga (Programação Visual, Projeto Gráfico, Editoração)


As incrições podem ser feitas pelo site do evento clicando aqui
Vagas limitadas

Estive em Trancoso, foda-se.

Me mandaram corrigir uma poesia, só que ninguém foi avisado que poesias são incorrigíveis.


É esse o grande problema da soma de regras para um mundo sem regras, que se perde em abraços fraternais sem esperança alguma no futuro. É lá, no futuro, que ecoam palavras há muito dias; estas, por sua vez, mortas.

Mortas antes de nascer. Mortas antes de serem ditas. Ditadas. Nas carteiras, nas lousas, nos cadernos, as palavras se perdem, acabam por chafurdar na merda da teoria. Gramática, nada mais que regra.

Regra sem sentido. Regra morta. Regra quebrada. Miríade. Estilhaço. Pedaço, Fração.

É só isso

Podia ser, mas não é. Línguas quentes roçam, validam promessas de amor.

Promete. Sabe? Prometem sem nada dizer.

Eu, como um monstro do circo voador, chafurdo também em regras arianas de palavras puras. Nunca cheguei a gostar, morro. Moro, morto, morou?

Se eu for viajar, provavelmente, será comigo mesmo. Não vou sozinho. Vou comigo, levando na bagagem, amigo. Será que vou? Melhor ficar. Mas, se ficar, quem vai tirar as fotos?

Vou sim. Se me pedirem pra ficar, não fico. Se me pedirem uns postais, baixo na internet e digo que comprei, coloco até um adesivo “Estive em Trancoso, foda-se”

Da série: coisas idiotas que NÃO devemos fazer

Lanterna Verde

Finalmente saiu o trailer do Lanterna Verde, com o Ryan Reynolds como protagonista. Sendo sincero, espero que esta não seja a versão definitiva, que essas piadinhas não estejam no filme e que o Hal Jordan assuma uma personalidade mais séria durante o filme (quem leu "Amanhecer Esmeralda" ou "Crepúsculo Esmeralda" ou qualquer coisa com o Hal deve se lembrar de sua personalidade, não é?).
Enfim, me incomodou um pouco e achei os efeitos fracos. Mas essa é a primeira versão e espero, sinceramente, que me surpreenda no cinema.
Assiste aí!

Feira do livro da USP!!!

Vale a pena conferir este evento, pessoal. A Feira do Livro da USP tem uns descontos abissais dos preços dos livros para o público. Por exemplo, no ano passado eu paguei R$15,00 reais nos livros da série Discworld (vendidos normalmente a R$35,00 nas livrarias.
Também dá para achar umas raridades fora de catálogo e completar coleções muito velhas.
Vá!

Necrópolis - resenha

Meu primeiro contato com o termo “Dark-Fantasy” se deu por meio da série “A Torre Negra”, de Stephen King. Confesso que naquela época eu não gostei muito do livro e larguei “O Pistoleiro” em uma pilha de livros para ler depois.
Grande engano o meu, não?
A “Dark-Fantasy”, em resumo, é uma variação da Fantasia convencional com retoques sombrios e elementos mais adultos, como a morte, o esquecimento e demais elementos que muitas vezes são associados ao Gótico ou às escolas literárias Românticas. Entretanto, cabe a cada escritor criar em seu mundo as características que o tornam singular.
Stephen King fez isso na “Torre Negra”, ao misturar elementos de Western com Cavalaria, o velho oeste com a lenda do Rei Arthur. Está tudo lá, uma Ordem de pistoleiros que têm tanta ou até mais diretrizes que cavaleiros de armadura, profecias, magos e uma busca. Além, é claro, de toda sorte de estranhos monstros…
Eu sempre achei que o Brasil precisava de uma obra à altura, algo que pudesse se vangloriar de fazer parte da “Dark-Fantasy”, que pudesse ser diferente, apresentar a fantasia e elementos sombrios em um mesmo mundo. Confesso, que no auge de minha arrogância, tentei ser este autor.
Também confesso que não consegui.
Mas existe a Editora Draco.
Existe Douglas MCT.
E Necrópolis.
Meu primeiro contato com o autor foi durante o lançamento do livro “Anno Domini – Manuscritos Medievais”, conversamos pouco naquela época, mas ele me apresentou a trilha sonora de seu livro. Fiquei surpreso com aquilo, ouvi o CD umas duas vezes, gravei no PC, perdi o arquivo e me arrependo disso até hoje.
Necrópolis, por sorte, veio suprir esta lacuna da “Dark-fantasy” no mercado brasileiro. Recém-lançado pela editora Draco o livro conta a história de Verne Vipero em busca do nyian (a alma) de seu irmão no mundo dos mortos. Em sua jornada Verne faz diversos amigos e inimigos, enfrenta vilões aterrorizantes e desafios incríveis em busca daquilo que acredita.
De modo geral Necrópolis fala de evolução, de enfrentar desafios, lutar por aquilo que se ama, descobrimento. Pois em sua busca por Vítor, Verne acaba por descobrir muito sobre si mesmo e evolui como pessoa e personagem. Fica uma pontinha de esperança no leitor ao fim de cada capítulo, para que Verne consiga salvar o seu irmão e voltar feliz para casa.
Mas, como eu disse lá no começo, a “Dark-Fantasy” não é colorida e animada como a fantasia convencional. A jornada de Verne é caracterizada por todos os elementos que se espera em uma fantasia, tribos nômades, seres alados, vampiros, engenhocas de tecnologia duvidosa e caçadoras de recompensa usando trajes sumários (Sim!!!). Mas, muito além de qualquer destes elementos, está a escuridão, o vazio e a desesperança que o mundo de Necrópolis insiste em oprimir no coração de seus moradores e leitores.
A linguagem do livro é fácil, lembra muito “A Bússola de Ouro”, sem grandes novidades neste aspecto. A história é envolvente, os personagens carismáticos, e o enredo cheio de mistérios (que serão revelados, eu espero, nos próximos livros).
Em resumo, se você está procurando uma história com fadas, duendes e raios de sol, vá ler outra coisa. Necrópolis não é o seu livro.
Mas, se você está buscando uma história de verdade…
Bem-vindo à Necrópolis…